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Dossie 2025 Especial

Tecendo memórias: Ditadura Civil-Militar, narrativas dissidentes e o passado vivo no Brasil do presente

Organizadores: Izabella Cardoso da Silva Campagnol (Doutoranda-USP) e Andrei Chirilã (Mestre – UNIFESP)

E-mail para recebimento dos artigos: andreichirila1996@hotmail.com e iza.cardosog@gmail.com 

Recebimento de artigos até 31 de abril de 2025

 

Neste dossiê, pretendemos compreender a Ditadura no Brasil como um evento marcante na história recente brasileira, destacando não apenas o campo da repressão, mas também o chamado período de “abertura”. Dessa forma, compreendemos que os vinte um anos de regime de exceção não se restringiram ao terrorismo de Estado e se caracterizaram como um momento de transformações, marcado pelo ressurgimento dos movimentos sociais no espaço público. Essas transformações são marcadas pela visibilidade de novas pautas, como a questão de gênero, sexualidade, raça/etnia, luta agrária, dentre outras. No contexto de sessenta anos após o golpe, é importante mostrar como essas atuações, mesmo no nível cotidiano, foram ações importantes para a construção de um projeto político e social mais cidadão e inclusivo.

Embora tenha sido um período repressivo da nossa história, defendemos que os movimentos sociais se mantiveram firmes ao longo de todo o período do Regime Militar, com destaque para a militância de esquerda, negra, feminista e homossexual. Neste escopo, de 1964 até o presente, pretendemos refletir sobre como os movimentos sociais resistiram à Ditadura e como contribuíram para o arrefecimento do regime, ao longo dos anos 1970, o que quer dizer que muito embora tenhamos um processo violento e que instituiu a censura e a tortura a partir do endurecimento do regime, a partir do AI-5, ao mesmo tempo, tivemos o florescimento de diversos movimentos que coexistiram com o período repressivo e que procuravam contrapor-se a ele direta e indiretamente.

Para ajudar a pensar tais questões, sugerimos a reflexão trazida por Gayatri Spivak. A autora define a subalternidade e o que é ser subalterno, pensando essas categorias a partir da perspectiva do próprio subalterno, subvertendo classificações oriundas dos grupos dominantes.

OBJETIVOS

O presente dossiê tem como objetivo reunir artigos centrados em uma análise sobre os grupos sociais silenciados, pensando as formas de resistência exercidas para além da via político-institucional, porém sem deixar de articular o cotidiano.

Dessa forma, compreendemos a contraposição ao autoritarismo por um ponto de vista que alarga a categoria de resistência, abordando-a como algo além do engajamento político-partidário e que se manifestou também a nível cotidiano. Ou seja, atuações no campo da luta contra a carestia, o racismo, a discriminação de gênero e sexualidade e os questionamentos contra as normas morais e comportamentais que serviam de embasamento à visão de mundo defendida pelo regime golpista. (Green, 2000)

No período de 1964 a 1985, é importante destacar como a repressão não afetou apenas aqueles/as ligados à oposição direta ao regime, mas toda e qualquer pessoa que fosse vista como ameaça aos valores defendidos por aqueles no poder.

Porém, é importante destacar que esses grupos marginalizados (subalternos) não eram incluídos na escrita da história sobre o período pelo ponto de vista de grupos atuantes na transformação do país. Este dossiê, portanto, se preocupa em inserir as vozes que foram excluídas.

E a preocupação em dialogar com a questão das subalternidades em suas diversas facetas (como sexualidade, gênero, classe e raça/etnia) se interliga a uma perspectiva presente nas atuais produções historiográficas, que entrecruzam as perspectivas micro e macroanalíticas, ressaltando a atuação das minorias sociais no passado e presente como forças motrizes de transformação da realidade.

Porém, atentos às novas produções historiográficas, ressaltamos a compreensão das identidades não como elementos separados entre si, mas como fruto de relações culturais e sociais possuidoras de uma carga histórica (Thompson, 2012) e que demarcam o atravessamento do tempo presente e suas demandas nas (re)interpretações dos eventos passados. (Sarlo, 2007)

Ou seja, em um contexto de ascensão e conquista de visibilidade por parte de minorias sociais antes marginalizadas, destaca-se a necessidade de (re)pensar abordagens e leituras conceituais dominantes. Consequentemente, é imperativo superar os modelos explicativos que se pretendem universalizantes, mas em realidade representam a continuação da dominação por meio do campo epistêmico ao ignorar as experiências ocorridas às margens. (Spivak, 2010; Sarlo, 2007)

Assim, as narrativas historiográficas são pensadas como ferramentas de desconstrução das estruturas sociais e como espaços privilegiados para afirmar a participação e as lutas das minorias como fundamentais na construção de uma nova sociedade.

JUSTIFICATIVAS DE RELEVÂNCIA HISTORIOGRÁFICA

O contexto de ascensão de minorias sociais na cena pública e no espaço acadêmico traz oportunidades de discussões relativas à sua condição enquanto sujeitos/grupos identitários historicamente marginalizados e pode enriquecer o debate acadêmico, contribuindo para que possamos refletir sobre diversos aspectos relativos ao tempo presente no Brasil. A proposta de dossiê visa promover maiores reflexões a respeito desses sujeitos marginalizados e pensá-los como pessoas ativas na história.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GREEN, James Naylor. “Mais amor e mais tesão”: a construção de um movimento brasileiro de gays, lésbicas e travestis. Cadernos Pagu, Campinas, v.15, n.15, p.271- 295, 2000. Disponível em: <https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/8635596/3367>. Acessado em 26 jul. 2024.

SARLO, Beatriz. Tempo passado: Cultura da memória e guinada subjetiva. Tradução de Rosa Freire d’Aguiar. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras; Belo Horizonte: Editora UFMG, 2007.

SPIVAK, Gayatri Chakravorthy. Pode o subalterno falar?. Tradução de Sandra Regina Goulart Almeida, Marcos Pereira Feitosa e André Pereira Feitosa. 1. ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.

THOMPSON, Edward Palmer. Algumas observações sobre classe e “falsa consciência”. In: NEGRO, Antonio Luigi; SILVA, Sergio (orgs.). As peculiaridades dos ingleses e outros artigos. 1. ed. Campinas: Editora UNICAMP, 2012, p.269-286.